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Pandemia da desigualdade

Atualizado: 12 de set. de 2021

O novo coronavirus evidencia um problema brasileiro tão antigo


Por Luísa Osik Lehmann*



Crédito: Reprodução/Instagram/@tonidagostinho (editada)


Todos os cenários se agravam durante uma crise e não seria diferente na crise da pandemia do novo coronavírus, com as desigualdades sociais e econômicas vigentes dentro do país. Diante do nosso legado mal resolvido com antecedentes históricos, combinados com a exploração de um sistema econômico altamente desigual, o vírus cria um cenário em que algumas parcelas da sociedade são mais prejudicadas que outras, como: a ampla gama de trabalhadores informais dependendo de uma renda básica “dada” pelo Estado para comer e os habitantes das periferias sendo desproporcionalmente mais expostos aos riscos do Covid-19.


A precarização das relações trabalhistas atenuadas tanto com a reforma da CLT (feita em 2017) quanto com o aumento da chamada “uberização” do trabalho resulta em uma vasta gama de trabalhadores informais que, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada pelo IBGE, chegou a 41,3% (de trabalhadores informais na população ocupada do Brasil). Esses não receberam nenhum auxílio das empresas pelas quais dedicam seus dias (e às vezes noites) e, desse modo, percebe-se que há uma relação entre a precarização e a grande quantidade de trabalhadores diante de um estado de crise por causa da pandemia.


Recomendações como medidas de higiene pessoal, confinamento e evitar aglomerações podem até parecer medidas simples, mas não são fáceis na realidade de moradores da periferia onde os imóveis têm um tamanho reduzido, com pouca ventilação, sem saneamento básico e onde muitas vezes o acesso à água se dá de forma irregular. O que se vê é que pandemias não são democráticas, pois em uma sociedade em que tantas desigualdades estruturais se fazem presentes, jogam-se pessoas para longe de um acolhimento social em momentos como esse e se coloca a grande população em um único parâmetro, mesmo nem todos tendo acesso igual a informações ou até a artigos de higiene pessoal.


Diante disso, surge um questionamento: em um país onde parte das pessoas não tem comida na mesa (com dados do estudo “Fome no Mundo” realizado pela ONU, em que 5,2 milhões de brasileiros estão em estado de subnutrição), como iremos exigir que as pessoas entendam a necessidade de uma quarentena, justificando que isso é em nome de um suposto bem comum? Para muitos, ficar sem sair para trabalhar significa enfrentar a fome dentro de casa e não existe a possibilidade de isolar alguém infectado quando o número de moradores excede o número de cômodos.


Portanto, evidencia-se que a parte mais frágil da sociedade continua sendo a maior vítima das fatalidades. Não estamos todos no mesmo barco: enquanto existem transatlânticos, existem também náufragos agarrados em troncos no meio da correnteza.


* Aluna do primeiro ano diurno do curso de Relações Internacionais na Universidade Positivo (2020).


(Texto originalmente publicado em 23 de abril de 2020)


Referências

SLEE, Tom. Uberização: a nova onda do trabalho precarizado. Editora Elefante, 2018.


VEGA, Miguel A. G. Como será a economia após o coronavírus. https://brasil.elpais.com/economia/2020-04-13/como-sera-a-economia-apos-o-coronavirus.html


DOWBOR, Ladislau. Além do coronavírus. https://diplomatique.org.br/alem-do-coronavirus/



NEPOMUCENO, Cleide A. Desigualdade social e coronavírus. https://www.otempo.com.br/opiniao/artigos/desigualdade-social-e-coronavirus-1.2318880


SILVEIRA, Daniel e ALVARENGA, Darlan. Trabalho informal avança para 41,3% da população ocupada e atinge nível recorde, diz IBGE.https://g1.globo.com/economia/noticia/2019/08/30/trabalho-informal-avanca-para-413percent-da-populacao-ocupada-e-atinge-nivel-recorde-diz-ibge.ghtml


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